quinta-feira, 11 de junho de 2015

Le Mans, 1955


Dia 11 de junho de 1955, todos estavam no circuito de La Sarthe, apreensivos para o início da maior e mais difícil prova do mundo: as 24 Horas de Le Mans. Como sempre há, os favoritos eram as Mercedes e os Jaguares, que traziam uma rivalidade imensa vinda da II Guerra. Diferentemente das 500 Milhas de Indianapolis, a Fórmula 1 não contava as 24h como uma corrida em seu calendário, algo que não evitava a presença de estrelas da categoria.

Nesse ano, a corrida contaria com 46 pilotos britânicos, 35 franceses, 11 italianos, 9 norte-americanos, 6 pilotos alemães, 4 belgas, 3 suiços, 2 pilotos argentinos, inclusive Fangio, 1 do Brasil e outro da Guatemala. O "desbravador" brasileiro daquela edição era Hermano da Silva Ramos.


As grandes marcas marcavam sua presença com suas equipes oficiais: a Porsche, a Jaguar, a Aston Martin, a Mercedes, a Maserati e a Ferrari colocaram três carros cada uma, "equipados" com os pilotos, respectivamente: Helmut Polensky, Richard von Frankenberger, Helmut Glöckler, Jaroslav Juhan, Auguste Veuillet e Zora Arkus Duntov. Mike Hawthorn, Ivor Bueb, Tony Rolt, Duncan Hamilton, Ron Beauman e Norman Dewis. Peter Collins, Pau Frère, Roy Salvadori, Peter Walker, Tony Brooks e John Riseley-Pritchard. Juan Manuel Fangio, Stirling Moss, Karl Kling, André Simon, Pierre Levegh e John Fitch. Luigi Musso, Gino Valenzano, Carlo Tomasi, Francesco Giardini, Roberto Mières e Cesare Perdisa. Maurice Trintignant, Harry Schell, Umberto Maglioli, Phill Hill, Eugenio Castelotti e Paolo Marzotto.


Só desse citados, nos lembramos mais de Fangio, Moss, Hawthorn, Collins, Rolt, Perdisa, Kling, Brooks, Frère, Salvadori, Musso, Hill, Trintignant, Schell, Maglioli e Castelotti. Mas ainda tinhamos outros nomes conhecidos como o de Hermano da Silva Ramos, Reg Parnell, Peter e Graham Whitehead, Masten Gregory, Yves Giraud-Cabantous e Ron Flockhart.

Para os grandes fãs da equipe preta e dourada, Colin Chapman esteve nessa edição, não apenas como um chefe de equipe, mas também como piloto, ao lado de Ron Flockhart, pilotando um Lotus Mark IX. Haviam outros nomes de equipes na qual nos lembramos muito, como MG, Cooper, Gordini e até mesmo a Bristol Aeroplane Company, que tem sua tradição e história construída nos aviões...


Depois de todas essas informações, para muitos desnecessárias, vamos para o que interessa, a corrida e o acontecimento. Pelo menos o início da prova seria feita em céu aberto, às três horas da tarde. A disputa, como todos previam, foi da Mercedes de Fangio e Moss com o Jaguar de Hawthorn e Bueb, que ainda se mantinha na frente enquanto a corrida já estava a todo vapor, mas sendo ferozmente perseguidos pela dupla da equipe alemã.

Já era fim da tarde, e os pilotos estavam prestes a fazer suas paradas. Mesmo assim, alguns batalhadores ainda se mantinham atrás de seus gigantescos volantes, entre eles Mike e Juan Manuel, que colocavam voltas em cima de seus adversários adversários. O próximo retardatário seria Levegh, com a outra Mercedes, tentando se recuperar na corrida.


Percebendo a falta de combustível, Mike Hawthorn passa rapidamente por Pierre Levegh e Lance Macklin, indo a caminho do pit lane, que na época era aberto. Com isso, o britânico freou, e como a Jaguar usava freios a disco, a freada foi muito mais brusca do que Macklin esperava, causando um travão inesperado para se desviar do bólido de Hawthorn. Infelizmente, o britânico acabou entrando na frente de Levegh, que instantes antes sinalizou para Fangio, que vinha logo atrás, passar por ele. O francês salvou a vida do companheiro, mas não a sua...

Pierre morto no asfalto

A Mercedes levantou voo depois de tocar no carro da equipe Macklin. Depois de capotar várias vezes, o Mercedes se dividiu ao meio, jogando estilhaços em cima do público e matando Levegh instantaneamente. O bloco do motor rolou por cima dos espectadores, que ainda tiveram que enfrentar as fortes chamas que vinham do carro prateado.


Pessoas foram decapitadas, perderam membros, causando óbito de boa parte do público presente na arquibancada principal, que ainda teve de enfrentar a fumaça do carro de Pierre, que estava no asfalto, "estirado" no chão e com partes de seu corpo queimadas. O público viu suas vidas mudarem para sempre, seja para aqueles que sobreviveram e perderam familiares, seja para os pilotos que estavam nos boxes vendo toda aquela tragédia.


A noite caia, e a única forma de impedir mais mortes foi não interromper a corrida, para que os espectadores não congestionassem as estradas. John Fitch era companheiro de Pierre Levegh, e agora sem carro não correria mais, se tornando uma figura importante para toda a história. O norte-americano morreu aos 95 anos em 2012, mas em seu aniversário de 92 anos fez um vídeo explicando a decisão alemã de se retirar da prova:

John Fitch, Pierre Levegh e Alfred Neubauer

"Quando eu estava no telefone, um jornalista que eu conhecia estava falando com um jornal e disse que as informações indicavam que 65 pessoas estavam mortas. Fiquei chocado, pois não sabíamos, estávamos nos boxes. Falei com Rudolph Uhlenhaut, diretor da Mercedes, e falei o que tinha acontecido. Disse: 'Rudy, talvez não seja a minha área, mas pensando no que aconteceu na guerra, a Mercedes não deve ganhar essa corrida em cima dos corpos de não importa quantos franceses. Não é bom para as relações, não é bom para a Mercedes, não é bom para ninguém'. Ele foi ligar para a cúpula, voltou e disse que os diretores ficaram horrorizados. E então disse que ficou decidido que eles iam se retirar. Moss ficou furioso comigo, pois ele e Fangio estavam na liderança e ele achava que eles iam vencer. Mas superou, hoje somos amigos."


Mal haviam se passado 10 anos do fim da II Guerra, e as relações dos países europeus com a Alemanha ainda eram com um "mau-olhado", e, para não piorar isso, a Mercedes decidiu se retirar, quando a lua já tomara conta do céu francês. Ainda haviam pessoas feridas, que mais tarde faleceriam, para se juntarem ao terrível número de 84 mortos...

A temporada de 1955 foi modificada em grandes proporções, a começar pela Fórmula 1, que tinha um grande calendário programado para aquele ano, mas que, depois do ocorrido, acabou perdendo os GPs da Alemanha, da França, da Espanha e da Suiça. Para que as corridas de automóveis voltassem a ser realizadas, os governos exigiram reformas em pró da segurança. Aos poucos as corridas voltaram a acontecer em várias países, que haviam aderido á esse tipo de "greve".


Mas a Suiça... Mesmo não sendo disputada lá, as 24 Horas de Le Mans de 1955 marcou toda a sua história, já que nunca mais foi disputada uma corrida novamente no país. Além disso, a tragédia mudou a trajetória e a história da Fórmula 1: a saída da Mercedes-Benz do automobilismo, que se deu no fim da temporada de 1955, com seu segundo título mundial. A volta da equipe alemã aconteceu apenas em 1989, quando o nazismo não era mais uma preocupação...

Uma das mais tristes cenas da história do automobilismo

E a corrida? Ela continuou! A Mercedes ainda chamou a Jaguar a retirar-se também da prova, em sinal de protesto e também de luto, mas a rivalidade falou mais alto, e os britânicos continuaram em sua busca incessante pela vitória, que chegou no dia seguinte, embaixo de chuva, talvez representando a tristeza de todos com o acontecimento daquele fatídico dia 11 de junho.


Mike Hawthorn e Ivor Bueb venceram a corrida, e o mais incrível, comemoraram com champagne. A Aston Martin de Peter Collins e Paul Frère terminou em segundo, 5 voltas atrás dos compatriotas. Fechando o TOP 3 esteve a equipe Ecurie Francorchamps, que usava os mesmos carros da Jaguar, e tinha Johnny Claes e Jacques Swarters como pilotos.

Isso tudo mudou a história do automobilismo, e ao mesmo tempo o destruiu em certos países, manchando o esporte que infelizmente sempre foi assim: "Loucos que correm em círculos em busca de um prêmio que vale mais do que a vida, se arriscando em altas velocidades, querendo provar ser o melhor...."

Os restos da Mercedes de Levegh

Imagens tiradas do Google Imagens

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