segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

Gregory, o piloto que comemorava o aniversário a cada 4 anos


29 de fevereiro, dia exclusivo de anos bissextos como este 2016 que vivemos. A Fórmula 1, com seus 66 anos e mais de 500 pilotos, é claro que não conseguiu escapar dessa data. Masten Gregory, apelidado de "The Kansas City Flash", por ter nascido em Kansas, participou de apenas 47 GPs na Fórmula 1, o que foi suficiente para escrever a história.

Carrol Shelby já chamou de "o americano mais rápido de sempre a ir lá e correr num carro de Grand Prix", enquanto o mítico Jim Clark considerava-o seu herói. Se o Brasil teve Chico Landi, os EUA teve Masten Gregory como um dos primeiros a correr regularmente numa jovem categoria chamada pelos europeus de 'Fórmula 1'. Além do mais, ele era um dos raros pilotos que usavam óculos em competições. Sua miopia era tão absurda que Shelby descreveu seus óculos como uma garrafa de Coca-Cola, de tão espessa que era.

Seu pai tinha uma empresa de seguros, mas após a sua morte, a mãe de Gregory acabou decidindo vender o estabelecimento. O dinheiro arrecadado seria dado aos seus três filhos, incluindo Masten, quando completassem 21 anos, mas como o caçula acabou se casando aos 19 anos, sem terminar o último ano de ensino médio, o dinheiro acabou sendo a catapulta para sua vida no automobilismo.

Desde jovem ele já era um grande entusiasta, e, quando comprou um sportscar Allard, um sonho se tornou realidade. Sua primeira corrida foi numa prova SCCA de 50 milhas em Caddo Mills, Texas. Depois de enfrentar problemas, abandonando a corrida, Gregory acabou investindo num motor Chrysler para a próxima prova, em Sebring, também marcado pelo seu abandono.


Em Stillwater, Oklahoma, Masten conquista sua primeira vitória, iniciando uma sequência de interessantes resultados e performances. Sua conquista na Guardsman Trophy (com 50 mil espectadores) e sua desclassificação na base área de Chanute foram seus grandes momentos nesse tempo, antes de ser convidado para participar dos 1000Km de Buenos Aires em 1954. O 14º lugar conquistado, apesar dos problemas enfrentados, não desanimou Gregory.

Seu tamanho e seu peso acabavam mascarando os 22 anos de vida que Masten já tinha, resultando em reclamações de pilotos mais experientes. Mesmo assim, o jovem americano conquistava resultados interessantes em provas de sportscar, como uma vitória em sua classe no trágico Tourist Trophy de 1955. Depois de passar um ano competindo em diversas corridas da SCCA, Gregory chamou atenção ao vencer na Argentina no início de 1957.

em Pescara

Mimo Dei, chefe da Scuderia Centro Sud se interessou pelo norte-americano, contratando-o para o GP de Mônaco de 1957. À bordo de um Maserati 250F privado, lá estava Masten Gregory na décima colocação do grid se preparando para uma das mais importantes provas do mundo. Sem se envolver com confusões, o piloto de Kansas escalava o pelotão se beneficiando dos abandonos, assumindo a quinta colocação há poucas voltas do fim.

Em sua frente? Nada mais nada menos do que Jack Brabham e Mike Hawthorn, que em poucas voltas estariam parando seus bólidos para abrir alas pro jovem estadunidense assumir a terceira posição. Há meros quatro giros do fim, Gregory era terceiro colocado para não perder mais, terminando sua primeira corrida num pódio surpreendente: resultado raríssimo de se acontecer.

Ainda em 1957, Gregory acabaria na oitava colocação no fantástico GP da Alemanha, seguido por um quarto lugar em Pescara e outro quarto posto em Monza, mostrando ao mundo todo seu talento. Ao fim da temporada, Masten havia marcado 10 invejosos pontos com uma equipe privada, quase superando nomes da estirpe de Brooks, Hawthorn e Musso.


A maluquice de se jogar do carro antes dele bater era cometida por Gregory, resultando em inúmeras lesões que quase tiraram-o da temporada de 1958. Seu melhor resultado conquistado em solo foi um sexto lugar no GP de Marrocos, num tempo em que apenas os cinco primeiros pontuavam. Apesar de suas doidices, Masten teve sua grande chance pela Cooper em 1959, sendo o terceiro piloto de Brabham e McLaren.

Em Mônaco, na primeira prova oficial como companheiro de uma dupla incrível da Cooper, Gregory tem um desempenho apagado, abandonando ainda no início da corrida. Semanas depois, em Zandvoort, dá show ao disputar pela vitória com Joakim Bonnier, terminando apenas na terceira colocação após Brabham e Moss se aproximarem de uma potencial vitória.

No GP da França, Masten novamente faz uma corrida marcada pelas suas primeiras voltas, pulando para segundo antes de enfrentar problemas que culminaram em seu abandono. Na Inglaterra ele volta a fazer uma prova apagada, retornando ao bom ânimo em AVUS, no último GP da Alemanha realizado no circuito de Berlim, onde disputou pela vitória com Tony Brooks até seu Cooper ter problemas enquanto liderava.

Brooks e Gregory na "Curva da Morte"

Em Monsanto ele volta a andar bem, superando o companheiro Bruce McLaren para terminar na segunda colocação, seu melhor resultado de todos. Infelizmente, em Goodwood, Gregory volta a velha rotina de 'abandonar o navio' de seu Jaguar, se machucando e ficando impossibilitado de fazer as últimas duas provas da temporada da Fórmula 1. No fim, o americano marcou os mesmos 10 pontos de 1957, terminando em oitavo.

A não-renovação de contrato de 1960 foi um golpe em sua carreira, com o público ficando dividido entre dois motivos: Cooper só inscreveria dois carros em 1960 ou Gregory era mais rápido do que Brabham? Para muitos, o americano era tão rápido quanto o tricampeão do mundo, jamais tendo a chance de mostrar tal talento. Andando consistentemente mais rápido do que McLaren, e no mesmo nível de 'Black Jack', parecia ser estranha a decisão de Cooper ao manter o neozelandês.

Antes de voltar a falar sobre sua carreira nos sportscar, sem muitas condições, Gregory foi um dos primeiros de muitos pilotos que tiveram seus talentos gastos de Fórmula 1 e utilizados com sucesso em provas de resistência. Seus últimos resultados decentes na categoria máxima do automobilismo foi um sexto lugar no GP dos EUA de 1962, um sétimo no GP da Grã-Bretanha também em 1962 e um oitavo no GP da Alemanha de 1965.

Como resultados oficiais não valem muito, Gregory pode ser lembrado por um ótimo desempenho no GP da França de 1962, onde estava perseguindo a terceira colocação de Dan Gurney (futuro vencedor da prova) antes de abandonar. Em sua última prova na Fórmula 1, Masten abandonou enquanto estava nas últimas colocações, fechando uma carreira coroada de azar na categoria. Mesmo assim, havia algo para se orgulhar além dos feitos que já destaquei: Gregory venceu a Kanonloppet (prova extra-oficial na Suécia) de 1962, sua única vitória à bordo de um fórmula.


Sua dedicação ao automobilismo era tão grande que ele se mudou, junto à sua família, para a Itália, perto da fábrica da Ferrari. Enzo ofereceu uma oferta para Gregory, que só não aceitou porque seria o quarto piloto do time italiano. Uma pena...

Apesar de ser ruim para a Fórmula 1, a demissão da Cooper fez crescer o nome de Gregory em provas como as 24 Horas de Le Mans, onde ele teve grandes performances como na edição de 1960, quando estava tão rápido que o helicóptero não o conseguia acompanhar na reta Mulsanne. Quatro anos depois, com algumas vitórias marcantes como nos 1000Km de Nürburgring de 1961, Masten entrou para a equipe da Ford, que tinha o objetivo de bater a Ferrari na tradicional prova de 24h.

Dividindo o GT40 com o ótimo Richie Ginther, Gregory viu o pódio ir pelos ares quando a caixa de câmbio teve problemas. No ano seguinte, pela NART, à bordo de uma Ferrari 250LM e ao lado de Jochen Rindt, o estadunidense finalmente conquistou a vitória de maior importância em sua carreira, as 24 Horas de Le Mans, a primeira em uma prova internacional para a Goodyear e a última da Ferrari na prestigiada prova.


Também em 1965, Gregory se aventurou pela única vez nas 500 Milhas de Indianapolis, se tornando um dos poucos pilotos a participar da Triplíce Coroa do Automobilismo e vencer uma de suas provas. Num BRP Ford, Masten estava na frente de casa e ansioso para mostrar todo seu talento, apesar da 31º colocação do grid.

Na primeira volta, 14 carros já haviam visto a traseira do BRP ultrapassando-os, mostrando que Gregory havia vindo para brigar pela vitória. Infelizmente, problemas no motor fizeram o estadunidense abandonar quando era (pasmem!) quinto colocado. Sua carreira nos sportscar ainda não havia chegado ao fim, conquistando mais e mais vitórias até a edição de 1972 das 24 Horas de Le Mans.

Naquele ano, o já experiente, e amigo de Masten, Jo Bonnier acabou falecendo na corrida, o que abalou o norte-americano que tinha, até então, 40 anos. Gregory jamais anunciou sua aposentadoria, mas deu um tempo para o automobilismo depois da morte do amigo, lembrando outros graves acidentes que havia sofrido durante a carreira, sendo até rotulado como 'destruidor'.

Quando morreu, aos 53 anos, de ataque cardíaco enquanto dormia em sua casa de inverno na Itália, é claro que em nossas memórias havia ficado algumas citações feitas por ele: "Francamente, se eu não fosse para o automobilismo eu teria que fazer alguma coisa que envolvesse perigo, porque é o momento de risco que faz o resto da vida suportável, valioso ou delicioso".


Gregory também é lembrado por outro conto: "Quando eu tinha uns 32 ou 33 anos, isto veio até mim, que até aquele momento da minha vida eu nunca tinha acreditado que eu viveria até os 30. Eu não fiz nenhum plano porque não parecia valer a pena. Stirling Moss me disse categoricamente que eu ia me matar logo depois de chegar à Europa. Todo mundo pensou que eu me mataria, e olhando para trás, eu estou surpreso que isso não aconteceu. Eu estava dirigindo, principalmente, sobre os reflexos. Eu realmente não conhecia nada sobre corridas. Eu só tinha um pouco de habilidade natural, eu acho."

Masten sempre foi um piloto agressivo, alguém que não se preocupava em correr com o pé-embaixo durante a corrida inteira. Seu estilo era único, estando à frente de seu tempo para a qualidade dos pilotos formados pelos EUA até então, caindo no esquecimento até mesmo por muitos moradores de sua cidade natal, que não dão o devido valor a alguém que arriscou a sua vida e escapou da morte ao mesmo tempo em que gravava o nome na história do automobilismo.

Esse era Masten Gregory, um dos milhares de pilotos subestimados pela sua cidade, pelo seu país e pelo mundo, esquecido no tempo como uma foto velha que ninguém gostaria de tirar do baú. Gregory não merecia o tratamento que recebe até hoje...

Fonte: www.atlasf1.com

Imagens tiradas do Google Imagens

2 comentários:

  1. Excelente post. Faltava sorte para ele, pois não ficava aquém de outros pilotos de alto nível, especialmente no Endurance.

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  2. Muito obrigado. É vasto o número de nomes marcados pelo azar, mas que botavam medo em gente grande no endurance, como Manfred Winkelhock

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